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Instinto materno?

Cartel: Mães Componentes: Sylara : Mais – Um; Hítala Gomes; Lara Moysés; Tânia Prates

Ao longo dos anos a instituição familiar sofreu modificações, os novos modelos de família são influenciados não só por uma compreensão diferenciada desta instituição, mas também por avanços científicos. Temos casais homoafetivos, mães sozinhas, casais heterossexuais, casais que optam pela adoção ou que tem um animal doméstico como membro da família.

A família é questão de laço social para os seres falantes. O discurso não exclui a biologia, mas “[...] a família universal biológica não existe. O que existe são formas particulares de laço de parentesco, variáveis segundo espaço e tempo”. (AFLALO, 2018, p.116)

Hoje, as incertezas do pai e, também da mãe, só mostram como o importante aqui não é o título, mas as funções que homem e/ou mulher decidem ocupar. A função materna, por exemplo, pode até ser encarnada por um homem, mesmo que ele não queira ser mulher. Afinal, o avanço da ciência possibilita hoje que os homens possam e queiram ter filhos, independente de uma mudança de sexo.

Diante dessa nova ordem familiar, hoje é o filho que faz a família existir, e assim transexuais operados podem se utilizar da Procriação Medicamente assistida (PMA) e terão seus filhos da mesma forma que casais homossexuais, sendo pela via da adoção ou ainda dos filhos nascidos de uma gestação para outro (GPA). No Brasil, esta ocorre sob determinadas condições, desde que não para fins comerciais.


Além disso, a medicina também é usada para casais com problemas de esterilidade. O que se nota é que tais avanços científicos e as transformações pelo direito, emancipam o desejo de se ter um filho, e isso torna-se independente da relação com o outro sexo.

Fica mais clara a disjunção entre a mulher e a fêmea naturalmente mãe, e isso demonstra que não há a naturalização da maternidade ou o que o senso comum chama de instinto materno. Portanto, de acordo com Laurent (2018, p.34), “[...] a filiação não se esgota nem na concepção, nem no nascimento, nem na família”.

Dessa forma, Lacan (1969) marca a necessidade de um desejo que não seja anônimo, ou seja, a função materna relaciona-se a um interesse particularizado por aquele indivíduo. A mãe é a primeira figura que responderá ao apelo da criança, tornando-se também, uma mãe simbólica que exerce uma função de mediação, necessária na manutenção da vida da criança. Por outro lado, o pai encarna uma função de barrar o gozo, sendo então um representante da lei, ou seja, aquele que permite um corte nesta relação dual mãe-criança, garantindo, assim, a singularidade do sujeito.

Não se define o que é ser homem ou mulher fora da linguagem ou fora do discurso, “[...] discurso no qual nos banhamos, patinhamos, do qual somos efeitos.” (BROUSSE, 2018, p.55) Este mesmo discurso diz muitas vezes As mulheres nasceram para ser mães.

De acordo com Brousse (2018, p.57): “No sistema simbólico, o feminino, inseparável do masculino, responde ao mesmo funcionamento lógico. Dizer, por exemplo, as mulheres não nasceram para serem mães participa da mesma lógica que as mulheres nasceram para serem mães”.

Quando Lacan, através da fórmula da sexuação diz A mulher não existe, ele está rompendo também com a universalidade de que todas as mulheres nasceram para ser mães, mulheres existem, uma a uma.

Há hoje imperativos sociais que colocam a constituição da mulher atrelada à maternidade. Misturando, assim, o seu desejo às imposições e exigências de perfeição que acredita ter que satisfazer. O que é o desejo da mulher e o que é a demanda social?

Com isso, o corpo da mulher ganha espaço para novos sofrimentos e novos sintomas. Um fenômeno muito marcante atualmente é o Baby Blues.

“Nesses estados de aflição absoluta e de desencorajamento extremo, pode acontecer de elas não verem outra saída senão a morte. Elas podem cogitar no suicídio, ou almejar, malgrado elas mesmas, o desaparecimento do filho. [...] Elas falam de dificuldade materna, de estremecimentos de mãe, de estranheza materna ou de travessias maternas, ou ainda de burnout materno, etc.” (SOLANO-SUAREZ, 2018, p.79)

Na ausência de manual ou bula que funcione efetivamente para a criança, cada mulher precisará inventar, a todo momento, uma resposta materna. Não há uma harmonia natural do par mãe- filho nos seres falantes, cada criança “porá à prova diferentemente enquanto mulher desenjante e faltosa”. (SOLANO-SUAREZ, 2018, p.91)

Por não saber o que fazer ou como lidar com tal situação, surge angústia, culpa, sintomas e devastação.


“O desejo de maternidade é um fato de cultura no ser humano. Pelo fato de falar, este não poderia nunca ir ao encontro de alguma unidade natural e menos ainda de um gozo primeiro desde sempre perdido”. (VINCIGUERRA, 2018, p.100)

Podemos dizer então, que a ideia de um instinto materno é cultural? Separar-se desse ideal ameniza o sofrimento e angústia da mãe-mulher? Se a psicanálise aponta para uma queda na função paterna, como manter a feminilidade junto com a maternidade? Estas são algumas questões que estão direcionando meu estudo de cartel.

Referências AFLALO, A. Homoanalisantes: O pai, um dos nomes da deusa branca? In: ALBERTI, C.; ALVARENGA, E. Ser mãe: mulheres psicanalistas falam da maternidade. Belo horizonte: EBP, 2018. BROUSSE, M.H. Forasexo (horsexe). In: ALBERTI, C.; ALVARENGA, E. Ser mãe: mulheres psicanalistas falam da maternidade. Belo horizonte: EBP, 2018. LACAN, J. Nota sobre a criança (1969). In: ______. Outros Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003. p. 369-370. ______. Os complexos familiares na formação do indivíduo: ensaio de análise de uma função em psicologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002. LAURENT, D. Tecno-maternidades. In: ALBERTI, C.; ALVARENGA, E. Ser mãe: mulheres psicanalistas falam da maternidade. Belo horizonte: EBP, 2018. SOLANO-SUARÉZ, E. Maternidade Blues. In: ALBERTI, C.; ALVARENGA, E. Ser mãe: mulheres psicanalistas falam da maternidade. Belo horizonte: EBP, 2018. VINCIGUERRA, R. P. Mamãe Solo. In: ALBERTI, C.; ALVARENGA, E. Ser mãe: mulheres psicanalistas falam da maternidade. Belo horizonte: EBP, 2018

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